Luis Fernando  Verissimo 
 Não faltam motivos para descrer da Humanidade. Vamos combinar  que fizemos coisas extraordinárias, mas nossa passagem pela Terra não está  sendo, exatamente, um sucesso. Para cada catedral erguida bombardeamos três,  para cada civilização vicejante liquidamos quatro, a cada gesto de grandeza  correspondem cinco ou seis de baixeza, para cada Gandhi produzimos sete tiranos,  para cada Patrícia Pilar dezessete energúmenos. Inventamos vacinas para salvar a  vida de milhões ao mesmo tempo que matamos outros milhões pelo contágio e a  fome. Criamos telefones portáteis que funcionam como gravadores, computadores -  e às vezes até telefones -, mas ainda temos problema com a coriza nasal. Nosso  dia a dia é cheio de pequenas calhordices, dos outros e nossas. Rareiam as  razões para confiar no vizinho ao nosso lado, o que dirá do político lá longe,  cuja verdadeira natureza muitas vezes só vamos conhecer pela câmera escondida.  Somos decididamente uma espécie inconfiável, além de venal, traiçoeira e  mesquinha. E estamos envenenando o planeta, num suicídio lento do qual ninguém  escapará. E tudo isso sem falar no racismo, no terrorismo e no Big Brother  Brasil. 
 Eu tinha desistido de esperar pela nossa regeneração. Ela não  viria pela religião, que se transformou em apenas outro ramo de negócios. Nem  viria pela revolução, mesmo que se pagasse para o povo ocupar as barricadas. Eu  achava que a espécie não tinha jeito, não tinha volta, não tinha salvação. Meu  desencanto era total. Só o abandonaria diante de alguma prova irrefutável de  altruísmo e caráter que redimisse a Humanidade. Uma prova de tal tamanho e tal  significado que anularia meu ceticismo terminal e restauraria minha esperança no  futuro. E esta prova virá neste domingo, se o Grêmio derrotar o Flamengo no  Maracanã.
 Se o Grêmio derrotar o Flamengo, o Internacional pode ser  campeão. Mas o mais importante não é isso. Se o Grêmio derrotar o Flamengo mesmo  sabendo as consequências e o possível beneficio para o arquiadversário, estará  dando um exemplo inigualável de superioridade moral. A volta da minha fé na  Humanidade não interessa, Grêmio. Pense no que dirá a História. Pense nas  futuras gerações!
 
Nenhum comentário:
Postar um comentário